BREVE HISTÓRIA DA REFORMA PROTESTANTE
I. INFLUÊNCIAS QUE CONDUZIRAM À REFORMA.
1. A Renascença.
Ou seja o despertar da Europa para um novo interesse pela literatura, pelas artes e pela ciência, isto é, a transformação dos médodos e propósitos medievais em métodos modernos. Durante a Idade Média os principais pensadores e escritores eram homens pertencentes à igreja. Porém, no período da Renascença, surgiu um novo interesse pela literatura clássica, pelo grego e pelo latim, pelas artes, de forma inteiramente separada da religião.
2. A Invenção da Imprensa.
A invenção da imprensa veio a ser um arauto e aliado da Reforma que se aproximava. Essa descoberta foi realizada por Gutemberg, em 1455, em Mogúncia, no Reno, e consistia em imprimir livros com tipos móveis, fazendo-os circular, facilmente, aos milhares. Antes de se inventar a imprensa, os livros eram copiados a mão. Uma Bíblia, na Idade Média, custava o salário de um ano de um operário. É muito significativo o fato de o primeiro livro impresso por Gutemberg haver sido a Bíblia, demonstrando, assim, o desejo dessa época.
3. O Espírito Nacionalista.
O patriotismo dos povos começou a manifestar-se, mostrando-se inconformados com a autoridade estrangeira sobre suas próprias igrejas nacionais; resistindo à nomeação de bispos, abades e dignitários da igreja feitas por um papa que vivia em um país distante. Não se conformava, o povo, com a contribuição do "óbolo de S. Pedro", para sustentar o papa e para a construção de majestosos templos em Roma.
II. A REFORMA NA ALEMANHA.
Enquanto o espírito de reforma e de independência despertava a Europa, a chama desse movimento começou a arder primeiramente na Alemanha, no eleitorado da Saxônia, sob a direção de Martinho Lutero
1. A Venda de Indulgências.
Leão X, em razão da necessidade de dinheiro para terminar as obras do templo de S. Pedro em Roma, permitiu que um seu enviado, João Tetzel, percorresse a Alemanha vendendo bulas, assinadas por ele, as quais, dizia, possuíam a virtude de conceder perdão de todos os pecados, não só aos possuidores da bula, mas também aos amigos, mortos ou vivos, em cujo nome fossem as bulas compradas, sem necessidade de confissão, nem absolvição pelo sacerdote. Tetzel fazia esta afirmação ao povo: "Tão depressa o vosso dinheiro caia no cofre, a alma de vossos amigos subirá do purgatório ao céu."
2. As Teses.
A data exata fixada pelos historiadores como início da grande Reforma foi registrada como 31 de outubro de 1517. Na manhã desse dia, Martinho Lutero afixou na porta da Catedral de Wittenberg um pergaminho que continha noventa e cinco teses ou declarações, quase todas relacionadas com a venda de indulgências; em sua aplicação atacava a autoridade do papa e do sacerdócio.
3. Queima da Bula Papal.
Após longas controvérsias e a publicação de folhetos que tornaram conhecidas as opiniões de Lutero em toda a Alemanha, seus ensinos foram formalmente condenados.
Lutero foi excomungado por uma bula do papa Leão X, no mês de junho de 1520. Pediram então ao eleitor Frederico da Saxônia que entregasse preso Lutero, a fim de ser julgado e castigado. Entretanto, em vez de entregar Lutero, Frederico deu-lhe ampla proteção. Martinho Lutero recebeu a excomunhão como um desafio, classificando-a de "bula execrável do anticristo". No dia 10 de dezembro, Lutero queimou a bula, em reunião pública, à porta de Wittemberg, diante de uma assembléia de professores, estudantes e do povo. Juntamente com a bula, Lutero queimou também cópias dos cânones ou leis estabelecidas por autoridades romanas. Esse ato constituiu a renúncia definitiva de Lutero à igreja católica romana.
4. A Dieta de Worms.
Em 1521 Lutero foi citado a comparecer ante a Dieta do Concílio Supremo do Reno. O novo imperador Carlos V concedeu um salvo-conduto a Lutero, para comparecer em Worms. Apesar de advertido por seus amigos de que poderia ter a mesma sorte de João Huss, Lutero respondeu-lhes: "Irei a Worms ainda que me cerquem tantos demônios quantas são as telhas dos telhados." Finalmente, no dia 17 de abril de 1521 Lutero compareceu ante a Dieta, presidida pelo imperador. Em resposta a um pedido de que se retratasse, e renegasse o que havia escrito, após algumas considerações respondeu que não podia retratar-se, a não ser que fosse desaprovado pelas Escrituras e pela razão, e terminou com estas palavras:
"Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão, porque não acredito nem no Papa nem nos concílios já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos - pelos textos da Sagrada Escritura que citei, estou submetido a minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero retratar-me de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável.""Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude. Amém!"
Instaram com o imperador Carlos para que prendesse Lutero, apresentando como razão, que a fé não podia ser confiada a hereges. Contudo, Lutero pôde deixar
Worms em paz.
5. O Castelo de Wartzburg.
Enquanto viajava de regresso à sua cidade, Lutero foi cercado e levado por soldados do eleitor Frederico para o castelo de Wartzburg, em Eisenach. Ali permaneceu Lutero guardado, em segurança e disfarçado, durante um ano, enquanto as tempestades de guerra e revoltas rugiam no império. Entretanto, durante esse tempo, Lutero não permaneceu ocioso; nesse período traduziu o Novo Testamento para a língua alemã, obra que por si só o teria imortalizado, pois essa versão é considerada como o fundamento do idioma alemão escrito. Isto aconteceu no ano de 1521. O Antigo Testamento só foi completado alguns anos mais tarde. Ao regressar do castelo de Wartzburg a Wittenberg, Lutero reassumiu a direção do movimento a favor da igreja Reformada, exatamente a tempo de salvá-la de excessos extravagantes.
6. O Nome Protestante. “Protesto de Espira”
A divisão dos vários estados alemães, em ramos Reformados e romanos, deu-se entre o Norte e o Sul. Os príncipes meridionais, dirigidos pela Áustria, aderiram a Roma, enquanto os do Norte se tornaram seguidores de Lutero. Em 1529 a Dieta reuniu-se na cidade de Espira, com o objetivo de reconciliar as partes em luta. Nessa reunião da Dieta os governadores católicos, que tinham maioria, condenaram as doutrinas de Lutero. Os príncipes resolveram proibir qualquer ensino do luteranismo
nos estados em que dominassem os católicos. Ao mesmo tempo determinaram que nos estados em que governassem luteranos, os católicos poderiam exercer livremente sua religião. Os príncipes luteranos protestaram contra essa lei desequilibrada e odiosa. Desde esse tempo ficaram conhecidos como protestantes, e as doutrinas que defendiam também ficaram conhecidas como religião protestante.
III. A REFORMA EM OUTROS PAÍSES.
Enquanto a Reforma estava ainda em início na Alemanha, eis que o mesmo espírito despontou também em muitos países da Europa.
1. Na Suíça.
A Reforma na Suíça despontou independente por completo do movimento na Alemanha, apesar de
se haver manifestado simultaneamente, sob a orientação de Ulrico Zuínglio, o qual, em 1517, atacou "a remissão de pecados", que muitos procuravam por meio de peregrinações a um altar da
Virgem de Einsieldn. No ano de 1522, Zuínglio rompeu definitivamente com Roma. A Reforma foi então formalmente estabelecida em Zurique, e dentro em breve tornou-se um movimento mais radical do que na Alemanha. Entretanto, o progresso desse movimento foi prejudicado por uma guerra civil entre cantões católico-romanos e protestantes, na qual Zuínglio morreu em 1531. Apesar de tudo, a reforma continuou a sua marcha, e mais tarde teve como dirigente João Calvino, o maior teólogo da igreja, depois de Agostinho; sua obra, "Instituições da Religião Cristã", publicada em 1536, quando Calvino tinha apenas vinte e sete anos, tornou-se regra da doutrina Protestante.
2. No Reino da Escandinávia.
O reino escandinavo, que nessa época se compunha da Dinamarca, Suécia e Noruega, sob um mesmo governo, recebeu prontamente os ensinos de Lutero, os quais tiveram a simpatia do rei Cristiano II. As lutas políticas e a guerra civil, durante algum tempo paralisaram o progresso da Reforma. Porém, finalmente, os três países aceitaram as idéias Luteranas.
3. Na França.
Na França, a igreja católica romana possuía mais liberdade do que no resto da Europa. Por essa razão era menos sentida a necessidade de independência eclesiástica de Roma. Contudo, ali iniciou-se um movimento religioso, antes da Reforma na Alemanha. No ano de 1512, Jacques Lefevre escreveu e pregou a doutrina da "justificação pela fé".
Dois partidos surgiram então na corte e entre o povo. Os reis que se sucediam no governo, apesar de
nominalmente católicos romanos, alternadamente se colocavam ao lado de cada partido. Porém o protestantismo sofreu um golpe quase mortal, no terrível massacre da noite de São Bartolomeu, 24 de agosto de 1572, quando quase todos os chefes protestantes e milhares de seus adeptos foram covardemente assassinados. A fé reformada enfrentou terrível perseguição, mas uma parte do povo francês continuou protestante. Apesar de pequeno em número, o protestantismo francês exerceu grande influência.
4. Nos Países-Baixos.
Os Países-Baixos, que se compunham dos atuais países da Bélgica e Holanda, estavam, no início da Reforma, sob o domínio da Espanha. Esses países receberam logo os ensinos da Reforma, porém foram perseguidos pelos regentes espanhóis. Nos Países-Baixos a reforma era um clamor de liberdade política e religiosa e a tirania dos espanhóis levou o povo a rebelar-se. Após prolongada guerra e incrível sofrimento, os Países-Baixos, sob a direção de Guilherme, o Taciturno, finalmente conquistaram a independência desligando-se do governo da Espanha, apesar de somente haverem alcançado o reconhecimento no ano de 1648, sessenta anos depois da morte de Guilherme. A Holanda, tornou-se protestante. Entretanto a Bélgica continuou em sua maioria católica romana.
5. Na Inglaterra:
O movimento da Reforma na Inglaterra passou por vários períodos de progresso e retrocesso devido as diferentes atitudes dos soberanos.
Um dos dirigentes da Reforma na Inglaterra foi João Tyndale, que traduziu o Novo Testamento na língua "mater", a primeira versão em inglês depois da invenção da imprensa; essa tradução, mais do que outra qualquer, modelou todas as traduções, a partir daí. Tyndale foi martirizado em Antuérpia, no ano de 1536.
Outro dirigente da Reforma foi Tomás Cranmer, arcebispo de Cantuária; Cranmer, após ajudar de modo notável a Inglaterra a tornar-se protestante, retratou-se no reinado da rainha católica Maria, na esperança de salvar a vida. Entretanto, ao ser condenado a morrer queimado, revogou a retratação.
(a) Sob Henrique VIII.
A reforma na Inglaterra foi favorecida e também prejudicada por Henrique VIII, o qual se separou de Roma, porque o papa não quis sancionar seu divórcio da rainha Catarina, irmã do imperador Carlos V. Henrique VIII fundou uma igreja católica inglesa, sendo ele mesmo o chefe.
(b) Sob Eduardo VI.
Sob o governo de Eduardo VI, que era muito jovem, e cujo reinado foi curto, a causa da Reforma progrediu muito. Dirigida por Cranmer e outros, a igreja da Inglaterra foi fundada e o Livro de Oração
foi compilado, com sua rica e rítmica forma de linguagem.
(c) Sob a Rainha Maria.
A rainha Maria, que sucedeu a Eduardo VI, era uma fanática romanista e iniciou um movimento para reconduzir seus súditos a sua antiga igreja, usando para isso a perseguição. Ela governou somente cinco anos; porém nesse período mais de trezentos protestantes sofreram o martírio.
(d) Sob a Rainha Elisabete I.
Com o acesso ao trono de Elizabete, a mais capaz de todos os soberanos da Inglaterra, as prisões se abriram, os exílios foram revogados, a Bíblia foi novamente honrada no púlpito e no lar, e durante seu longo governo, denominado a "época de Elisabete", a mais religiosa da história inglesa, a igreja da Inglaterra firmou-se outra vez e tomou a forma que dura até hoje.
6. Na Escócia.
Na Escócia a Reforma teve progresso muito lento, pois a igreja e o Estado eram governados pela mão férrea do cardeal Beaton e pela rainha Maria de Guise, mãe da rainha Maria da Escócia. O cardeal foi assassinado, a rainha morreu, e logo a seguir João Knox, em 1559, assumiu a direção do movimento reformador. Mediante suas idéias radicais e inflexíveis, sua firme determinação e sua irresistível energia, mesmo contra o engenho e a atração de sua romanista soberana, a rainha Maria dos escoceses, Knox pôde fazer desaparecer todos os vestígios da antiga religião, e levar a Reforma muito mais longe, do que a da Inglaterra. A igreja Presbiteriana, segundo foi planejada por João Knox, veio a ser a igreja da Escócia.
IV. A CONTRA-REFORMA.
Após haver-se iniciado o movimento da Reforma, um poderoso esforço foi também iniciado pela igreja católica romana no sentido de recuperar o terreno perdido na Europa, para destruir a fé protestante e para enviar missões católico-romanas a países estrangeiros. Esse movimento foi chamado Contra-Reforma.
1. Reforma Dentro da Igreja Católica Romana.
Por via do Concílio de Trento, convocado no ano de 1545 pelo papa Paulo III, principalmente com o objetivo de investigar os motivos e pôr fim aos abusos que deram causa à Reforma. O Concílio era composto de todos os bispos e abades da igreja, e durou quase vinte anos, durante os governos de
quatro papas, de 1545 a 1563. Todos esperavam que a separação entre católicos e protestantes teria fim, e que a igreja ficaria outra vez unida. Os próprios protestantes admitem que depois do Concílio de Trento os papas se conduziram com mais acerto do que os que governaram antes.
2. A Ordem dos Jesuítas.
Fundada em 1534 pelo espanhol Inácio de Loyola. Era uma ordem monástica caracterizada pela combinação da mais severa disciplina, intensa lealdade à igreja e à Ordem, profunda devoção religiosa, e um marcado esforço para arrebanhar prosélitos.
Seu principal objetivo era combater o movimento protestante. Hoje é uma das forças mais ativas para divulgar e fortalecer a igreja católica romana em todo o mundo.
3. Perseguição Ativa.
No continente europeu, todos os governos católicos preocupavam-se em extirpar a fé protestante, usando para isso a espada. Na Espanha estabeleceu-se a Inquisição, por meio da qual inumerável multidão sofreu torturas e muitas pessoas foram queimadas vivas. Nos Países-Baixos o governo espanhol determinou matar todos aqueles que fossem suspeitos de heresias. Na França o espírito de perseguição alcançou o clímax, na matança da noite de São Bartolomeu, 24 de agosto de 1572, e que se prolongou por várias semanas. Segundo o cálculo de alguns historiadores, morreram de vinte a setenta mil pessoas.
4. Esforços Missionários dos Católicos Romanos.
Os esforços missionários da igreja católica romana devem ser reconhecidos, também, como uma das forças da Contra-Reforma. Esses esforços eram dirigidos em sua maioria pelos jesuítas, e tiveram como resultado a conversão das raças nativas da América do Sul, do México e de grande parte do Canadá. Na índia e países circunvizinhos estabeleceram-se missões por intermédio de Francisco Xavier, um dos fundadores da sociedade dos jesuítas. As missões católicas, nos países pagãos, iniciaram-se séculos antes das missões protestantes e conquistaram grande número de membros e bem assim poder para a respectiva igreja.
5. A Guerra dos Trinta Anos.
Como resultado inevitável de interesses e propósitos contrários dos estados da Reforma e católicos na Alemanha, iniciou-se então uma guerra no ano de 1618, isto é, um século depois da Reforma. Essa guerra envolveu quase todas as nações europeias. Na história ela é conhecida como a Guerra dos Trinta Anos. As rivalidades políticas e religiosas estavam ligadas a essa guerra. Às vezes estados que professavam a mesma fé, apoiavam partidos contrários. A luta estendeu-se durante quase uma geração, e toda a Alemanha sofreu ou seus efeitos terríveis. Finalmente, em 1648, a guerra terminou, com a assinatura do tratado de paz de Westfália, que fixou os limites dos estados católicos e protestantes, que duram até hoje. O período da Reforma pode ser considerado terminado a esse ponto.
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