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domingo, 31 de outubro de 2021

507 Anos da Reforma Protestante (31 de Outubro de 1517)


BREVE HISTÓRIA DA REFORMA PROTESTANTE

I. INFLUÊNCIAS QUE CONDUZIRAM À REFORMA.

1. A Renascença.

Ou seja o despertar da Europa para um novo interesse pela literatura, pelas artes e pela ciência, isto é, a transformação dos médodos e propósitos medievais em métodos modernos. Durante a Idade Média os principais pensadores e escritores eram homens pertencentes à igreja. Porém, no período da Renascença, surgiu um novo interesse pela literatura clássica, pelo grego e pelo latim, pelas artes, de forma inteiramente separada da religião.


2. A Invenção da Imprensa.

A invenção da imprensa veio a ser um arauto e aliado da Reforma que se aproximava. Essa descoberta foi realizada por Gutemberg, em 1455, em Mogúncia, no Reno, e consistia em imprimir  livros com tipos móveis, fazendo-os circular, facilmente, aos milhares. Antes de se inventar a imprensa, os livros eram copiados a mão. Uma Bíblia, na Idade Média, custava o salário de um ano de um operário. É muito significativo o fato de o primeiro livro impresso por Gutemberg haver sido a Bíblia, demonstrando, assim, o desejo dessa época.


3. O Espírito Nacionalista.

O patriotismo dos povos começou a manifestar-se, mostrando-se inconformados com a autoridade estrangeira sobre suas próprias igrejas nacionais; resistindo à nomeação de bispos, abades e dignitários da igreja feitas por um papa que vivia em um país distante. Não se conformava, o povo, com a contribuição do "óbolo de S. Pedro", para sustentar o papa e para a construção de majestosos templos em Roma.


II. A REFORMA NA ALEMANHA.

Enquanto o espírito de reforma e de independência despertava a Europa, a chama desse movimento começou a arder primeiramente na Alemanha, no eleitorado da Saxônia, sob a direção de Martinho Lutero


1. A Venda de Indulgências.

Leão X, em razão da necessidade de dinheiro para terminar as obras do templo de S. Pedro em Roma, permitiu que um seu enviado, João Tetzel, percorresse a Alemanha vendendo bulas, assinadas por ele, as quais, dizia, possuíam a virtude de conceder perdão de todos os pecados, não só aos possuidores da bula, mas também aos amigos, mortos ou vivos, em cujo nome fossem as bulas compradas, sem necessidade de confissão, nem absolvição pelo sacerdote. Tetzel fazia esta afirmação ao povo: "Tão depressa o vosso dinheiro caia no cofre, a alma de vossos amigos subirá do purgatório ao céu."


2. As Teses.

A data exata fixada pelos historiadores como início da grande Reforma foi registrada como 31 de outubro de 1517. Na manhã desse dia, Martinho Lutero afixou na porta da Catedral de Wittenberg um pergaminho que continha noventa e cinco teses ou declarações, quase todas relacionadas com a venda de indulgências; em sua aplicação atacava a autoridade do papa e do sacerdócio. 


3. Queima da Bula Papal.

Após longas controvérsias e a publicação de folhetos que tornaram conhecidas as opiniões de Lutero em toda a Alemanha, seus ensinos foram formalmente condenados. 

Lutero foi excomungado por uma bula do papa Leão X, no mês de junho de 1520. Pediram então ao eleitor Frederico da Saxônia que entregasse preso Lutero, a fim de ser julgado e castigado. Entretanto, em vez de entregar Lutero, Frederico deu-lhe ampla proteção. Martinho Lutero recebeu a excomunhão como um desafio, classificando-a de "bula execrável do anticristo". No dia 10 de dezembro, Lutero queimou a bula, em reunião pública, à porta de Wittemberg, diante de uma assembléia de professores, estudantes e do povo. Juntamente com a bula, Lutero queimou também cópias dos cânones ou leis estabelecidas por autoridades romanas. Esse ato constituiu a renúncia definitiva de Lutero à igreja católica romana.


4. A Dieta de Worms.


Em 1521 Lutero foi citado a comparecer ante a Dieta do Concílio Supremo do Reno. O novo imperador Carlos V concedeu um salvo-conduto a Lutero, para comparecer em Worms. Apesar de advertido por seus amigos de que poderia ter a mesma sorte de João Huss, Lutero respondeu-lhes: "Irei a Worms ainda que me cerquem tantos demônios quantas são as telhas dos telhados." Finalmente, no dia 17 de abril de 1521 Lutero compareceu ante a Dieta, presidida pelo imperador. Em resposta a um pedido de que se retratasse, e renegasse o que havia escrito, após algumas considerações respondeu que não podia retratar-se, a não ser que fosse desaprovado pelas Escrituras e pela razão, e terminou com estas palavras

"Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão, porque não acredito nem no Papa nem nos concílios já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos - pelos textos da Sagrada Escritura que citei, estou submetido a minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero retratar-me de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável.""Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude. Amém!"

Instaram com o imperador Carlos para que prendesse Lutero, apresentando como razão, que a fé não podia ser confiada a hereges. Contudo, Lutero pôde deixar

Worms em paz.


5. O Castelo de Wartzburg.

Enquanto viajava de regresso à sua cidade, Lutero foi cercado e levado por soldados do eleitor Frederico para o castelo de Wartzburg, em Eisenach. Ali permaneceu Lutero guardado, em segurança e disfarçado, durante um ano, enquanto as tempestades de guerra e revoltas rugiam no império. Entretanto, durante esse tempo, Lutero não permaneceu ocioso; nesse período traduziu o Novo Testamento para a língua alemã, obra que por si só o teria imortalizado, pois essa versão é considerada como o fundamento do idioma alemão escrito. Isto aconteceu no ano de 1521. O Antigo Testamento só foi completado alguns anos mais tarde. Ao regressar do castelo de Wartzburg a Wittenberg, Lutero reassumiu a direção do movimento a favor da igreja Reformada, exatamente a tempo de salvá-la de excessos extravagantes.


6. O Nome Protestante. “Protesto de Espira”

A divisão dos vários estados alemães, em ramos Reformados e romanos, deu-se entre o Norte e o Sul. Os príncipes meridionais, dirigidos pela Áustria, aderiram a Roma, enquanto os do Norte se tornaram seguidores de Lutero. Em 1529 a Dieta reuniu-se na cidade de Espira, com o objetivo de reconciliar as partes em luta. Nessa reunião da Dieta os governadores católicos, que tinham maioria, condenaram as doutrinas de Lutero. Os príncipes resolveram proibir qualquer ensino do luteranismo

nos estados em que dominassem os católicos. Ao mesmo tempo determinaram que nos estados em que governassem luteranos, os católicos poderiam exercer livremente sua religião. Os príncipes luteranos protestaram contra essa lei desequilibrada e odiosa. Desde esse tempo ficaram conhecidos como protestantes, e as doutrinas que defendiam também ficaram conhecidas como religião protestante.


III. A REFORMA EM OUTROS PAÍSES.

Enquanto a Reforma estava ainda em início na Alemanha, eis que o mesmo espírito despontou também em muitos países da Europa.


1. Na Suíça.

A Reforma na Suíça despontou independente por completo do movimento na Alemanha, apesar de

se haver manifestado simultaneamente, sob a orientação de Ulrico Zuínglio, o qual, em 1517, atacou "a remissão de pecados", que muitos procuravam por meio de peregrinações a um altar da

Virgem de Einsieldn. No ano de 1522, Zuínglio rompeu definitivamente com Roma. A Reforma foi então formalmente estabelecida em Zurique, e dentro em breve tornou-se um movimento mais radical do que na Alemanha. Entretanto, o progresso desse movimento foi prejudicado por uma guerra civil entre cantões católico-romanos e protestantes, na qual Zuínglio morreu em 1531. Apesar de tudo, a reforma continuou a sua marcha, e mais tarde teve como dirigente João Calvino, o maior teólogo da igreja, depois de Agostinho; sua obra, "Instituições da Religião Cristã", publicada em 1536, quando Calvino tinha apenas vinte e sete anos, tornou-se regra da doutrina Protestante.


2. No Reino da Escandinávia.

O reino escandinavo, que nessa época se compunha da Dinamarca, Suécia e Noruega, sob um mesmo governo, recebeu prontamente os ensinos de Lutero, os quais tiveram a simpatia do rei Cristiano II. As lutas políticas e a guerra civil, durante algum tempo paralisaram o progresso da Reforma. Porém, finalmente, os três países aceitaram as idéias Luteranas.


3. Na França.

Na França, a igreja católica romana possuía mais liberdade do que no resto da Europa. Por essa razão era menos sentida a necessidade de independência eclesiástica de Roma. Contudo, ali iniciou-se um movimento religioso, antes da Reforma na Alemanha. No ano de 1512, Jacques Lefevre escreveu e pregou a doutrina da "justificação pela fé"

Dois partidos surgiram então na corte e entre o povo. Os reis que se sucediam no governo, apesar de

nominalmente católicos romanos, alternadamente se colocavam ao lado de cada partido. Porém o protestantismo sofreu um golpe quase mortal, no terrível massacre da noite de São Bartolomeu, 24 de agosto de 1572, quando quase todos os chefes protestantes e milhares de seus adeptos foram covardemente assassinados. A fé reformada enfrentou terrível perseguição, mas uma parte do povo francês continuou protestante. Apesar de pequeno em número, o protestantismo francês exerceu grande influência.


4. Nos Países-Baixos.

Os Países-Baixos, que se compunham dos atuais países da Bélgica e Holanda, estavam, no início da Reforma, sob o domínio da Espanha. Esses países receberam logo os ensinos da Reforma, porém foram perseguidos pelos regentes espanhóis. Nos Países-Baixos a reforma era um clamor de liberdade política e religiosa e a tirania dos espanhóis levou o povo a rebelar-se. Após prolongada guerra e incrível sofrimento, os Países-Baixos, sob a direção de Guilherme, o Taciturno, finalmente conquistaram a independência desligando-se do governo da Espanha, apesar de somente haverem alcançado o reconhecimento no ano de 1648, sessenta anos depois da morte de Guilherme. A Holanda, tornou-se protestante. Entretanto a Bélgica continuou em sua maioria católica romana.


5. Na Inglaterra:

O movimento da Reforma na Inglaterra passou por vários períodos de progresso e retrocesso devido as diferentes atitudes dos soberanos.

Um dos dirigentes da Reforma na Inglaterra foi João Tyndale, que traduziu o Novo Testamento na língua "mater", a primeira versão em inglês depois da invenção da imprensa; essa tradução, mais do que outra qualquer, modelou todas as traduções, a partir daí. Tyndale foi martirizado em Antuérpia, no ano de 1536. 

Outro dirigente da Reforma foi Tomás Cranmer, arcebispo de Cantuária; Cranmer, após ajudar de modo notável a Inglaterra a tornar-se protestante, retratou-se no reinado da rainha católica Maria, na esperança de salvar a vida. Entretanto, ao ser condenado a morrer queimado, revogou a retratação. 

(a) Sob Henrique VIII.

A reforma na Inglaterra foi favorecida e também prejudicada por Henrique VIII, o qual se separou de Roma, porque o papa não quis sancionar seu divórcio da rainha Catarina, irmã do imperador Carlos V. Henrique VIII fundou uma igreja católica inglesa, sendo ele mesmo o chefe. 


(b) Sob Eduardo VI.

Sob o governo de Eduardo VI, que era muito jovem, e cujo reinado foi curto, a causa da Reforma progrediu muito. Dirigida por Cranmer e outros, a igreja da Inglaterra foi fundada e o Livro de Oração

foi compilado, com sua rica e rítmica forma de linguagem.  


(c) Sob a Rainha Maria.

A rainha Maria, que sucedeu a Eduardo VI, era uma fanática romanista e iniciou um movimento para reconduzir seus súditos a sua antiga igreja, usando para isso a perseguição. Ela governou somente cinco anos; porém nesse período mais de trezentos protestantes sofreram o martírio.


(d) Sob a Rainha Elisabete I.

Com o acesso ao trono de Elizabete, a mais capaz de todos os soberanos da Inglaterra, as prisões se abriram, os exílios foram revogados, a Bíblia foi novamente honrada no púlpito e no lar, e durante seu longo governo, denominado a "época de Elisabete", a mais religiosa da história inglesa, a igreja da Inglaterra firmou-se outra vez e tomou a forma que dura até hoje.


6. Na Escócia.

Na Escócia a Reforma teve progresso muito lento, pois a igreja e o Estado eram governados pela mão férrea do cardeal Beaton e pela rainha Maria de Guise, mãe da rainha Maria da Escócia. O cardeal foi assassinado, a rainha morreu, e logo a seguir João Knox, em 1559, assumiu a direção do movimento reformador. Mediante suas idéias radicais e inflexíveis, sua firme determinação e sua irresistível energia, mesmo contra o engenho e a atração de sua romanista soberana, a rainha Maria dos escoceses, Knox pôde fazer desaparecer todos os vestígios da antiga religião, e levar a Reforma muito mais longe, do que a da Inglaterra. A igreja Presbiteriana, segundo foi planejada por João Knox, veio a ser a igreja da Escócia.


IV. A CONTRA-REFORMA. 

Após haver-se iniciado o movimento da Reforma, um poderoso esforço foi também iniciado pela igreja católica romana no sentido de recuperar o terreno perdido na Europa, para destruir a fé protestante e para enviar missões católico-romanas a países estrangeiros. Esse movimento foi chamado Contra-Reforma.


1. Reforma Dentro da Igreja Católica Romana.

Por via do Concílio de Trento, convocado no ano de 1545 pelo papa Paulo III, principalmente com o objetivo de investigar os motivos e pôr fim aos abusos que deram causa à Reforma. O Concílio era composto de todos os bispos e abades da igreja, e durou quase vinte anos, durante os governos de

quatro papas, de 1545 a 1563. Todos esperavam que a separação entre católicos e protestantes teria fim, e que a igreja ficaria outra vez unida. Os próprios protestantes admitem que depois do Concílio de Trento os papas se conduziram com mais acerto do que os que governaram antes.


2. A Ordem dos Jesuítas.

Fundada em 1534 pelo espanhol Inácio de Loyola. Era uma ordem monástica caracterizada pela combinação da mais severa disciplina, intensa lealdade à igreja e à Ordem, profunda devoção religiosa, e um marcado esforço para arrebanhar prosélitos. 

Seu principal objetivo era combater o movimento protestante. Hoje é uma das forças mais ativas para divulgar e fortalecer a igreja católica romana em todo o mundo.


3. Perseguição Ativa.

No continente europeu, todos os governos católicos preocupavam-se em extirpar a fé protestante, usando para isso a espada. Na Espanha estabeleceu-se a Inquisição, por meio da qual inumerável multidão sofreu torturas e muitas pessoas foram queimadas vivas. Nos Países-Baixos o governo espanhol determinou matar todos aqueles que fossem suspeitos de heresias. Na França o espírito de perseguição alcançou o clímax, na matança da noite de São Bartolomeu, 24 de agosto de 1572, e que se prolongou por várias semanas. Segundo o cálculo de alguns historiadores, morreram de vinte a setenta mil pessoas.


4. Esforços Missionários dos Católicos Romanos.

Os esforços missionários da igreja católica romana devem ser reconhecidos, também, como uma das forças da Contra-Reforma. Esses esforços eram dirigidos em sua maioria pelos jesuítas, e tiveram como resultado a conversão das raças nativas da América do Sul, do México e de grande parte do Canadá. Na índia e países circunvizinhos estabeleceram-se missões por intermédio de Francisco Xavier, um dos fundadores da sociedade dos jesuítas. As missões católicas, nos países pagãos, iniciaram-se séculos antes das missões protestantes e conquistaram grande número de membros e bem assim poder para a respectiva igreja.


5. A Guerra dos Trinta Anos.

Como resultado inevitável de interesses e propósitos contrários dos estados da Reforma e católicos na Alemanha, iniciou-se então uma guerra no ano de 1618, isto é, um século depois da Reforma. Essa guerra envolveu quase todas as nações europeias. Na história ela é conhecida como a Guerra dos Trinta Anos. As rivalidades políticas e religiosas estavam ligadas a essa guerra. Às vezes estados que professavam a mesma fé, apoiavam partidos contrários. A luta estendeu-se durante quase uma geração, e toda a Alemanha sofreu ou seus efeitos terríveis. Finalmente, em 1648, a guerra terminou, com a assinatura do tratado de paz de Westfália, que fixou os limites dos estados católicos e protestantes, que duram até hoje. O período da Reforma pode ser considerado terminado a esse ponto.


Fonte:


HURLBUT, Jesse Lyman. História da Igreja Cristã. Vida, 1979.

As 95 Teses de Lutero (31 de Outubro de 1517)


As 95 Teses afixadas por Martinho Lutero na Abadia de Westminster a 31 de outubro de 1517, fundamentalmente "Contra o Comércio das Indulgências"

Movido pelo amor e pelo empenho em prol do esclarecimento da verdade, discutir-se-á em Wittemberg, sob a presidência do Rev. Padre Martinho Lutero, o que segue. Aqueles que não puderem estar presentes para tratarem o assunto verbalmente conosco, o poderão fazer por escrito. Em nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.

1ª Tese

Dizendo nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo: Arrependei-vos... etc., certamente quer que toda a vida dos seus crentes na terra seja contínuo e ininterrupto arrependimento.

2ª Tese

E esta expressão não pode e não deve ser interpretada como referindo-se ao sacramento da penitência, isto é, à confissão e satisfação, a cargo dos sacerdotes.

3ª Tese

Todavia não quer que apenas se entenda o arrependimento interno; o arrependimento interno; o arrependimento interno nem mesmo é arrependimento quando não produz toda sorte de mortificação da carne.

4ª Tese

Assim sendo, o arrependimento e o pesar, isto é, a verdadeira penitência, perdura enquanto o homem se desagradar de si mesmo, a saber, até à entrada para a vida eterna.

5ª Tese

O papa não quer e não pode dispensar de outras penas além das que impôs ao seu alvitre ou nem acordo com os cânones, que são estatutos papais.

6ª Tese

O papa não pode perdoar dívida, senão declarar e confirmar aquilo que já foi perdoado por Deus, ou então o faz nos casos que lhe foram reservados. Nestes casos, se desprezados, a dívida em absoluto deixaria de ser anulada ou perdoada.

7ª Tese

Deus a ninguém perdoa a dívida sem que ao mesmo tempo o subordine, em sincera humildade, ao ministro, seu substituto.

8ª Tese

Cânones poenitentiales, que são as ordenanças de prescrição da maneira em que se deve confessar e expiar, apenas são impostos aos vivos, e, de acordo com as mesmas ordenanças, não dizem respeito aos moribundos.

9ª Tese

Eis por que o Espírito Santo nos faz bem mediante o papa, excluindo este de todos os seus decretos ou direitos o artigo da morte e da necessidade suprema.

10ª Tese

Procedem desajuizadamente e mal os sacerdotes que reservam e impõe aos moribundos penitências canônicas ou para o purgatório a fim de ali serem cumpridas.

11ª Tese

Este joio, que é o de transformar a penitência e satisfação, prevista pelos cânones ou estatutos, em penitência ou penas do purgatório, foi semeado enquanto os bispos dormiam.

12ª Tese

Outrora canônica poenae, ou seja, penitência e satisfação por pecados cometidos, eram impostos, não depois, mas antes da absolvição, com a finalidade de provar a sinceridade do arrependimento e do pesar.

13ª Tese

Os moribundos tudo satisfazem com a sua morte e estão mortos para o direito canônico, sendo, portanto, dispensados, com justiça, de sua imposição.

14ª Tese

Piedade ou amor imperfeitos da parte daquele que se acha às portas da morte, necessariamente resultam em grande temor; logo, quanto menos o amor, tanto maior o temor.

15ª Tese 

Este temor e espanto em si tão só, sem nos referirmos a outras coisas, basta para causar o tormento e o horror do purgatório, pois se avizinham da angústia do desespero.

16ª Tese

Inferno, purgatório e céu parecem ser tão diferentes quanto o são um do outro o desespero completo, incompleto ou quase desespero e certeza.

17ª Tese

Parece que assim como no purgatório diminuem a angústia e o espanto das almas, também deve crescer e aumentar o amor.

18ª Tese

Bem assim parece não ter sido provado, nem por boas razões e nem pela Escritura, que as almas do purgatório se encontram fora da possibilidade do mérito ou do crescimento no amor.

19ª Tese

Parece ainda não ter sido provado que todas as almas do purgatório tenham certeza de sua salvação e não receiem mais por ela, não obstante nós termos esta certeza.

20ª Tese

Por isso o papa não quer dizer e nem compreender com as palavras “perdão plenário de todas as penas” o perdão de todo o tormento, mas tão só as penas por ele impostas.

21ª Tese

Eis por que erram os apregoadores de indulgências ao afirmarem ser o homem perdoado de todas as penas e salvo mediante indulgência do papa.

22ª Tese

Com efeito, o papa nenhuma pena dispensa às almas do purgatório das que, segundo os cânones da igreja, deviam ter expiado e pago na presente vida.

23ª Tese

Verdade é que se houver qualquer perdão plenário das penas, este apenas será dado aos mais perfeitos, que são muitos poucos.

24ª Tese

Logo, a maioria do povo é ludibriado com as pomposas promessas do indistinto perdão, impressionando-se o homem singelo com as penas pagas. 

25ª Tese

Exatamente o mesmo poder geral que o papa tem sobre o purgatório, qualquer bispo e cura d’almas o tem no seu bispado e na sua paróquia, quer de modo especial e quer para com os seus em particular.

26ª Tese

O papa faz muito bem em não conceder o perdão às almas em virtude do poder das chaves (coisa que não possui), mas pela ajuda ou em forma de intercessão.

27ª Tese

Pregam futilidades humanas quantos alegam que no momento em que a moeda soa ao cair na caixa a alma se vai do purgatório. 

28ª Tese

Certo é que, no momento em que a moeda soa na caixa, vem lucro, e o amor ao dinheiro cresce e aumenta; a ajuda, porém, ou a intercessão da igreja tão só correspondem à vontade e ao agrado de Deus.

29ª Tese

E quem sabe, se todas as almas do purgatório querem ser libertadas, quando há quem diga o que sucedeu com S. Severino e Pascoal.

30ª Tese

Ninguém tem certeza da suficiência do arrependimento e pesar verdadeiros, muito menos certeza pode ter de haver alcançado pleno perdão dos seus pecados.

31ª Tese

Tão raro como existe alguém que possui arrependimento e pesar verdadeiros, tão raro também é aquele que verdadeiramente alcança indulgência, sendo bem poucos os que se encontram.

32ª Tese

Irão para o diabo, juntamente com os seus mestres, aqueles que julgam obter certeza de sua salvação mediante breves de indulgência.

33ª Tese

Há que acautelar-se muito e ter cuidado daqueles que dizem: A indulgência do papa é a mais sublime e mais preciosa graça ou dádiva de Deus, pela qual o homem é reconciliado com Deus. 

34ª Tese

Tanto assim que a graça da indulgência apenas se refere à pena satisfatória, estipulada por homens.

35ª Tese

Ensinam de maneira ímpia quantos alegam que aqueles que querem livrar almas do purgatório ou adquirir breves de confissão não necessitam de arrependimento e pesar.

36ª Tese

Tudo o cristão que se arrepende verdadeiramente dos seus pecados e sente pesar por ter pecado, tem pleno perdão da pena e da dívida, perdão esse que lhe pertence mesmo sem breve de indulgência.

37ª Tese

Todo e qualquer cristão verdadeiro, vivo ou morto, é participante de todos os bens de Cristo e da Igreja, por dádiva de Deus, mesmo sem breve de indulgência.

38ª Tese

Entretanto se não devem desprezar o perdão e a distribuição deste pelo papa. Pois, conforme declarei, o seu perdão consiste numa declaração do perdão divino.

39ª Tese

Ë extremamente difícil, mesmo para os mais doutos teólogos, exaltar diante do povo ao mesmo tempo a grande riqueza da indulgência e, ao contrário, o verdadeiro arrependimento e pesar.

40ª Tese

O verdadeiro arrependimento e pesar buscam e amam o castigo; mas a profusão da indulgência livra das penas e faz com que se as aborreça, pelo menos quando há oportunidade para tanto.

41ª Tese

É necessário pregar cautelosamente sobre a indulgência papal, para que o homem singelo não julgue erradamente ser a indulgência preferível às demais obras de caridade ou melhor do que elas. 

42ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos, não ser pensamento e opinião do papa que a aquisição de indulgências de alguma maneira possa ser comparada com qualquer obra de caridade.

43ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos, proceder melhor quem dá aos pobres ou empresta ao necessitado do que os que compram indulgência.

44ª Tese

É que pela obra de caridade cresce o amor ao próximo e o homem torna-se mais piedoso; pelas indulgências, porém, não se torna melhor senão mais seguro e livre da pena.

45ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos que aquele que vê seu próximo padecer necessidade e a despeito disto gasta dinheiro com indulgências, não adquire indulgência do papa, mas desafia a ira de Deus.

46ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos que, se não tiverem fartura, fiquem com o necessário para a casa e de maneira nenhuma o esbanjem com indulgências.

47ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos ser a compra de indulgência livre e não ordenada.

48ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos que se o papa precisa conceder mais indulgências, mais necessita de uma oração fervorosa do que de dinheiro.

49ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos serem muito boas as indulgências do papa enquanto o homem não confiar nelas; mas muito prejudiciais quando, em conseqüência delas, se perde o temor de Deus.

50ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos que se o papa tivesse conhecimento da traficância dos apregoadores de indulgência, preferiria ver a basílica de São Pedro ser reduzida a cinzas a ser edificada com a pele, a carne e os ossos de suas ovelhas. 

51ª Tese

Deve-se ensinar aos cristãos que o papa, por um dever seu, preferiria distribuir o seu dinheiro aos que em geral são despojados do dinheiro pelos apregoadores de indulgência, vendendo, se necessário, a própria basílica de São Pedro.

52ª Tese

Esperar ser salvo mediante breves de indulgência é vaidade e mentira, mesmo se o comissário de indulgências e o próprio papa oferecessem sua alma como garantia.

53ª Tese

São inimigos de Cristo e do papa quantos por causa da prédica de indulgências proíbem a palavra de Deus nas demais igrejas.

54ª Tese

Comete-se injustiça contra a palavra de Deus quando, no mesmo sermão, se consagra tanto ou mais tempo à indulgência do que à pregação da palavra do Senhor.

55ª Tese

A intenção do papa não pode ser outra do que celebrar a indulgência, que é a coisa menor, com um toque de sino, uma pompa, uma cerimônia, enquanto o evangelho, que é o essencial, importa ser anunciado mediante cem toques de sino, centenas de pompas e solenidades.

56ª Tese

Os tesouros da igreja, dos quais o papa tira e distribui as indulgências, não são bastante mencionados e nem suficientemente conhecidos na Igreja de Cristo.

57ª Tese

É evidente que não são bens temporais, porquanto muitos pregadores não os distribuem com facilidade, antes os ajuntam.

58ª Tese

Também não são os merecimentos de Cristo e dos santos, porquanto este sempre são suficientes, e, independente do papa, operam graça do homem interior e são a cruz, a morte e o inferno do homem exterior.

59ª Tese

São Lourenço chama aos pobres, os quais são membros da Igreja, tesouros da Igreja, mas no sentido em que a palavra era usada na sua época. 

60ª Tese

Afirmamos com boa razão, sem temeridade ou leviandade, que estes tesouros são as chaves da Igreja, que lhe foram dadas pelo merecimento de Cristo.

61ª Tese

Evidente é que, para o perdão das penas e para a absolvição em determinados casos, o poder do papa por si só basta.

62ª Tese

O verdadeiro tesouro da Igreja é o santíssimo evangelho da glória e da graça de Deus.

63ª Tese

Este tesouro, porém, é muito desprezado e odiado, porquanto faz com que os primeiros sejam os últimos.

64ª Tese

Enquanto isso o tesouro das indulgências é notoriamente o mais apreciado, porque faz com que os últimos sejam os primeiros.

65ª Tese

Por essa razão os tesouros evangélicos foram outrora as redes com que se apanhavam os ricos e abastados.

66ª Tese

Os tesouros das indulgências, porém, são as redes com que hoje se apanham as riquezas dos homens.

67ª Tese

As indulgências, apregoadas pelos seus vendedores como a mais sublime graça, decerto assim são consideradas porque lhes trazem grandes proventos.

68ª Tese

Nem por isso semelhante indulgência é a mais ínfima graça, comparada com a graça de Deus e a piedade da cruz.

69ª Tese

Os bispos e os sacerdotes são obrigados a receber os comissários das indulgências apostólicas com toda reverência. 

70ª Tese

Entretanto tem muito maior dever de conservar abertos os olhos e ouvidos, para que estes comissários, em vez de cumprirem as ordens recebidas do papa, não apregoem os seus próprios sonhos.

71ª Tese

Quem levanta a sua voz contra a verdade das indulgências papais é excomungado e maldito.

72ª Tese

Aquele, porém, que se insurgir contra as palavras insolentes e arrogantes dos apregoadores de indulgências, seja abençoado.

73ª Tese

Da mesma maneira em que o papa usa de justiça ao fulminar com a excomunhão aos que em prejuízo do comércio de indulgências procedem astuciosamente.

74ª Tese

Muito mais deseja atingir com o desfavor e a excomunhão àqueles que, sob pretexto de indulgências, prejudicam a santa caridade e a verdade pela sua maneira de agirem.

75ª Tese

Considerar a indulgência do papa tão poderosa, a ponto de absolver alguém dos pecados, mesmo que (coisa impossível de se expressar) tivesse deflorado a mãe de Deus, significa ser demente.

76ª Tese

Bem ao contrário afirmamos que a indulgência do papa nem mesmo pode anular o menor pecado venial no que diz respeito a culpa que representa.

77ª Tese

Afirmar que nem mesmo São Pedro, se no momento fosse papa, poderia dispensar maior indulgência, constitui insulto contra São Pedro e o papa.

78ª Tese

Dizemos, ao contrário, que o atual papa, e todos os que o sucederam, é detentor de muito maior indulgência, isto é, o evangelho, dom de curar, etc., de acordo com o que diz 1 Coríntios 12.6-9. 

79ª Tese

Alegar ter a cruz de indulgências, erguida e adornada com as armas do papa, tanto valor como a própria cruz de Cristo é blasfêmia.

80ª Tese

Os bispos, padres e teólogos que consentem em semelhante linguagem diante do povo, terão de prestar contas desta atitude.

81ª Tese

Semelhante pregação, a enaltecer atrevida e insolentemente a indulgência, torna difícil até homens doutos defenderem a honra e dignidade do papa contra a calúnia e as perguntas mordazes e astutas dos leigos.

82ª Tese

Haja vista exemplo como este: Por que o papa não livra duma só vez todas as almas do purgatório, movido pela santíssima caridade e considerando a mais premente necessidade das mesmas, havendo santa razão para tanto, quando, em troca de vil dinheiro para a construção da basílica de São Pedro, livra inúmeras delas, logo por motivo bastante infundado?

83ª Tese

Outrossim: Por que continuam as exéquias e missas de ano em sufrágio das almas dos defuntos e não se devolve o dinheiro recebido para esse fim ou não se permite os doadores busquem de novo os benefícios ou prebendas oferecidos em favor dos mortos, quando já não é justo continuar a rezar pelos que se acham remidos?

84ª Tese

E: Que nova santidade de Deus e do papa é esta a consentir a um ímpio e inimigo resgate uma alma piedosa e agradável a Deus por amor ao dinheiro e não livrar esta mesma alma piedosa e amada por Deus do seu tormento por amor espontâneo e sem paga?

85ª Tese

E: Por que os cânones de penitência, isto é, os preceitos de penitência, que faz muito caducaram e morreram de fato pelo desuso, tornam a remir mediante dinheiro, pela concessão de indulgência, como se continuassem em vigor e bem vivos? 

86ª Tese

E: Por que o papa, cuja fortuna é maior do que a de qualquer Creso, não prefere construir a basílica de São Pedro de seu próprio bolso em vez de o fazer com o dinheiro de cristãos pobres?

87ª Tese

E: Que perdoa ou concede o papa pela sua indulgência àqueles que pelo arrependimento completo tem direito ao perdão ou indulgência plenária?

88ª Tese

Afinal: Que benefício maior poderia receber a igreja se o papa, que atualmenteo faz uma vez ao dia cem vezes ao dia concedesse aos fiéis este perdão a título gratuito?

89ª Tese

Visto o papa visar mais a salvação das almas mediante a indulgência do que o dinheiro, por que razão revoga os breves de indulgência outrora por ele concedidos, quando tem sempre as mesmas virtudes?

90ª Tese

Desfazer estes argumentos muito sutis dos leigos, recorrendo apenas à força e não por razões sólidas apresentadas, significa expor a igreja e o papa ao escárnio dos inimigos e desgraçar os cristãos.

91ª Tese

Se, portanto, a indulgência fosse apregoada no espírito e sentido do papa, estas objeções poderiam ser facilmente respondidas e nem mesmo teriam surgido.

92ª Tese

Fora, pois, com todos este pregadores que dizem à igreja de Cristo: Paz! Paz! Sem que haja paz!

93ª Tese

Abençoados, porém, sejam todos os pregadores que dizem à igreja de Cristo: Cruz! Cruz! Sem que haja cruz!

94ª Tese

Admoeste-se os cristãos a que se empenhem em seguir seu Cabeça, Cristo, através da cruz, da morte e do inferno;

95ª Tese

E desta maneira mais esperem entrar no reino dos céus por muitas aflições do que confiando em promessas de paz infundadas.

Fonte:

e-book: Documentos históricos do Protestantismo
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